Vedação
só é válida quando tatuagem ferir princípios constitucionais.
Por maioria, o Plenário do
Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão desta quarta-feira (17), julgou
inconstitucional a proibição de tatuagens a candidatos a cargo público
estabelecida em leis e editais de concurso público. Foi dado provimento ao
Recurso Extraordinário (RE) 898450, com repercussão geral reconhecida, em que
um candidato a soldado da Polícia Militar de São Paulo foi eliminado por ter
tatuagem na perna. “Editais de concurso público não podem estabelecer restrição
a pessoas com tatuagem, salvo situações excepcionais, em razão de conteúdo que
viole valores constitucionais”, foi a tese de repercussão geral fixada.
O relator do RE, ministro
Luiz Fux, observou que a criação de barreiras arbitrárias para impedir o acesso
de candidatos a cargos públicos fere os princípios constitucionais da isonomia
e da razoabilidade. Em seu entendimento, qualquer obstáculo a acesso a cargo
público deve estar relacionado unicamente ao exercício das funções como, por
exemplo, idade ou altura que impossibilitem o exercício de funções específicas.
Salientou que a jurisprudência do STF prevê que o limite de idade previsto em
lei é constitucional, desde que justificável em relação à natureza das
atribuições do cargo a ser exercido.
O ministro destacou que a
tatuagem, por si só, não pode ser confundida como uma transgressão ou conduta
atentatória aos bons costumes. Segundo ele, a tatuagem passou a representar uma
autêntica forma de liberdade de manifestação do indivíduo, pela qual não pode
ser punido, sob pena de flagrante violação dos princípios constitucionais. Para
o ministro Fux, o respeito à democracia não se dá apenas na realização de
eleições livres, mas também quando se permite aos cidadãos se manifestarem da
forma que quiserem, desde que isso não represente ofensa direta a grupos ou
princípios e valores éticos.
Em seu entendimento, o
desejo de se expressar por meio de pigmentação definitiva não pode ser
obstáculo a que um cidadão exerça cargo público. “Um policial não se torna
melhor ou pior em suas funções apenas por ter tatuagem”, afirmou.
O relator destacou que o
Estado não pode querer representar o papel de adversário da liberdade de
expressão, impedindo que candidatos em concurso ostentem tatuagens ou marcas
corporais que demonstrem simpatia por ideais que não sejam ofensivos aos
preceitos e valores protegidos pela Constituição Federal. “A máxima de que cada
um é feliz à sua maneira deve ser preservada pelo Estado”, ressaltou o
ministro.
Em seu voto (leia a
íntegra), o ministro Fux assinalou que tatuagens que prejudiquem a disciplina e
a boa ordem, sejam extremistas, racistas, preconceituosas ou que atentem contra
a instituição devem ser coibidas. Observou, por exemplo, que um policial não
pode ostentar sinais corporais que signifiquem apologias ao crime ou exaltem organizações
criminosas. Entretanto, não pode ter seu ingresso na corporação impedido apenas
porque optou por manifestar-se por meio de pigmentação definitiva no corpo.
O relator explicou que as
Forças Armadas vedam o ingresso de pessoas com tatuagens que transmitam
mensagens relacionadas à violação da lei e da ordem, tais como as que
discriminem grupos por sua cor, origem, credo, sexo, orientação sexual ou que
incitem o consumo de drogas ou a prática de crimes, por entender que são
incompatíveis com a função militar.
Caso
No caso dos autos, o
candidato obteve, em primeira instância, decisão favorável em mandado de
segurança impetrado contra sua exclusão do concurso público para o
preenchimento de vagas de soldado de 2ª classe depois que, em exame médico, foi
constatado que possui uma tatuagem em sua perna direita que estaria em
desacordo com as normas do edital. O Estado de São Paulo recorreu alegando que
o edital estabeleceu, de forma objetiva, parâmetros para admissão de tatuagens,
mas que o candidato não se enquadrava nessas normas.
Em acórdão, o Tribunal de
Justiça de São Paulo (TJ-SP) destacou que o edital é a lei do concurso e a
restrição em relação à tatuagem encontra-se expressamente prevista. Assim, ao
se inscreverem no processo seletivo, os candidatos teriam aceitado as regras. O
acórdão salienta que quem faz tatuagem tem ciência de que estará sujeito a esse
tipo de limitação. Acrescenta que a disciplina militar engloba também o
respeito às regras e o descumprimento da proibição a tatuagens não seria um bom
início na carreira.
Por maioria de votos, o
Plenário deu provimento ao RE 898450 para impedir que o candidato seja
eliminado do certame por ter tatuagem. Ficou vencido o ministro Marco Aurélio,
que entendeu não haver inconstitucionalidade no acórdão do TJ-SP.
- Leia a íntegra do voto do
relator, ministro Luiz Fux.
Processos relacionados: RE
898450
Fonte: STF