Somente em uma operação, a
Polícia Federal detectou irregularidades em 42 seleções, todas para tribunais e
de responsabilidade da Fundação Carlos Chagas, que, até, agora, não prestou
nenhum esclarecimento. Esquemas são cada vez mais criativos
As fraudes em concursos
públicos estão disseminadas pelo país. Em apenas uma operação da Polícia
Federal, deflagrada em outubro, foram descobertos 42 certames adulterados por
uma organização criminosa liderada por um técnico judiciário de Rondônia. A
investigação, fruto da chamada de Operação Afronta, descobriu que o acesso a 64
cargos públicos, de seleções realizadas entre 2010 e 2015 se deu por meios
ilícitos. Dos concursos, 30 foram para tribunais, que pagam excelentes
salários, e o restante para Assembleias Legislativas e autarquias. As provas
estavam sob responsabilidade da Fundação Carlos Chagas.
Desde que a investigação
teve início, após a PF detectar fraudes em uma prova realizada em Sorocaba
(SP), em 2014, pelo menos dez pessoas foram presas. Há mandados de prisão
espalhados por vários pontos do país: São Paulo, Paraná, Rio de Janeiro,
Alagoas, Rondônia. Além de disseminados, os esquemas estão cada vez mais
criativos. No caso da Operação Afronta, os fraudadores usaram de micro-câmeras
a pontos eletrônicos, praticamente imperceptíveis, para obter as respostas das
provas.
“Como o vazamento de
informações é feito por meio da tecnologia, muitas vezes usando internet, fica
mais difícil descobrir e responsabilizar os culpados na esfera criminal”, disse
o advogado Sérgio Camargo, especialista em concursos públicos. A situação se
complica porque os crimes digitais ainda são pouco abordados na legislação
brasileira. “Não há dúvidas de que aumentou o número de fraudes em concursos
públicos. Acredito que só ficamos sabendo de uma minoria”, afirmou.
Segundo Camargo, apesar de
existirem vários critérios de segurança — como marca d’água e numeração de lote
de provas —, os bandidos têm conseguido driblá-los. “O mal avança na frente do
bem, porque os fraudadores sempre inovam na forma de praticar o crime”, alertou
Camargo. Para ele, falta preparo por parte da administração pública para coibir
as fraudes. Na falta de medidas eficientes, ela costuma recorrer ao caminho mais
fácil: a anulação do certame.
“As consequências na vida de
quem se preparou para um concurso são incalculáveis. Cancelar as provas é uma
atitude arrasadora, principalmente para pessoas que se dedicaram muito.
Tem gente que fica anos
estudando e perde a oportunidade por culpa da má-fé de terceiros”, afirmou
Carlos Mendonça, professor de direito previdenciário do Gran Cursos Online. Ele
ressaltou que, por não chegar à raiz do problema, a suspensão do certame nem
sempre é a melhor solução. “É a mais fácil, mas não resolve o número de
ocorrências”, assinalou.
Na avaliação de Camargo, é
preciso atentar para os prejuízos incalculáveis aos outros candidatos. Mesmo se
remarcar a prova e isentá-los de pagamento das novas inscrições, a
administração pública não cobre outros prejuízos, como passagens e hospedagens
dos que viajam para fazer as provas. “É preciso mais rigidez na punição de
fraudadores e de quem se beneficia dos esquemas”, disse.