Decisão proferida pela 3ª Turma do STJ.
Em julgamento de recurso especial, a Terceira Turma do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a possibilidade de se limitar em 30% da
renda líquida do devedor o percentual de desconto de parcela de empréstimo em
conta-corrente.
O caso envolveu um empréstimo de R$ 122 mil reais e um acordo de
renegociação de dívida, na modalidade empréstimo consignado, a ser quitado
mediante o desconto de 72 parcelas mensais de R$ 1.697,35 da conta corrente do
devedor.
Ao verificar que o valor estabelecido como prestação superava a
aposentadoria do devedor (R$ 1.673,91), a sentença, confirmada no acórdão de
apelação, determinou a limitação dos descontos a 30% dos proventos líquidos do
correntista.
No STJ, o banco alegou que a cláusula-mandato é irrevogável e
considerou descabida a limitação com base em percentual dos rendimentos
líquidos. Pediu o restabelecimento dos descontos na forma pactuada, ou, subsidiariamente,
no limite de 50% da remuneração bruta.
Dignidade humana
O relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, negou o pedido.
Segundo ele, acolher a pretensão do banco seria uma violação do princípio da
dignidade da pessoa humana. Sanseverino relacionou a situação ao fenômeno do
superendividamento, “uma preocupação atual do direito do consumidor em todo o
mundo, decorrente da imensa facilidade de acesso ao crédito nos dias de hoje”.
Sanseverino destacou a ausência de legislação no Brasil que tutele o
consumidor endividado. Ao citar o Projeto de Lei 3.515/2015, em tramitação na
Câmara dos Deputados, que dispõe sobre o superendividamento do consumidor e
prevê medidas judiciais para garantir o mínimo existencial, o relator disse que
a via judicial tem sido hoje a única saída para muitos consumidores.
“Constitui dever do Poder Judiciário o controle desses contratos de
empréstimo para evitar que abusos possam ser praticados pelas instituições
financeiras interessadas, especialmente nos casos de crédito consignado”, disse
o ministro.
Risco à subsistência
Sanseverino reconheceu que o contrato foi celebrado com a anuência do
consumidor, mas ressaltou que o princípio da autonomia privada não é absoluto,
“devendo respeito a outros princípios do nosso sistema jurídico (função social
do contrato, boa-fé objetiva), inclusive a um dos mais importantes, que é o
princípio da dignidade da pessoa humana”.
A turma, por unanimidade, considerou o desconto em conta excessivo,
reconhecendo a existência de risco à subsistência do consumidor e de sua
família, e determinou que ele fique limitado a 30% da remuneração líquida do
correntista, excluídos os descontos obrigatórios, como Imposto de Renda e
Previdência..
Processo relacionado: REsp 1584501
Fonte: STJ